Luto Gestacional

O Silêncio e a Dor Invisível

O luto gestacional é feito de muitas dores, físicas, emocionais e relacionais, que têm vindo a ganhar lugar e voz, permitindo às famílias encontrar espaço para dar nome, e validar, a sua dor. Trata-se de sofrimento causado pela perda de um bebé durante a gestação ou logo após o nascimento. Apesar de ser uma realidade vivida por muitas famílias, e de começar a ser cada vez mais estudado, o luto gestacional ainda constitui um assunto “tabu”, associado a silêncios, isolamento e dificuldades em ser compreendido e validado socialmente.

A Experiência do Luto Gestacional

Quando uma gravidez resulta na perda de um bebé, esta morte tem um impacto na mulher e no casal a diferentes níveis – emocional, psíquico e social – assim como na estrutura e dinâmica familiar.

Perder um bebé é um evento devastador, independentemente da fase da gestação. Para muitos pais, a maternidade é o início da construção do vínculo, uma ligação emocional única, que se inicia antes do nascimento. Quando a perda surge (de forma abrupta ou planeada por alguma condição médica), todas as expetativas, sonhos e planos que começavam a formar-se precisam ocupar novos lugares ainda difíceis de encontrar: entre o vazio, o turbilhão emocional, a ausência de explicações e sentidos… abre-se espaço para a experiência de que algo é ali roubado e carrega sofrimento. O que outrora seria um momento vivido de grande felicidade, de repente, torna-se num acontecimento marcado pela dor, porventura até traumático.

A dor do luto gestacional é, como todas as dores e perdas, única. É uma perda onde moram outras perdas, tais como: a ausência de um filho, a fotografia do primeiro sorriso, as palavras nunca ditas, os passos que nunca serão dados, um nome escrito na história de um futuro não vivido. É uma ausência de memórias compartilhadas e a presença constante de “e se…”, frases inacabadas, assuntos que podem ter ficado pendentes, zangas por expressar, ideias que martelam o pensamento numa busca pelo mais desejado: alterar o que na verdade se viveu. Porque é também neste caminho, de avanços e recuos, que se vão construindo novas formas de tolerar a dor e reenquadrar a perda.

O Luto Silenciado

Nem sempre a perda gestacional é reconhecida pela sociedade. Frases como “Ainda és muito jovem, podes voltar a engravidar.”, “ É a lei da vida” , “Estás a chorar, por quê?”, “Pelo menos, ainda estava no início da gravidez” ou “ Foi melhor assim” são muito comuns e, ao mesmo tempo e ainda que sem essa intenção, invalidantes. Estas expressões podem gerar, nas mães (e famílias) enlutadas, incompreensão e a experiência de que a sua perda é desvalorizada, provocando a inibição na expressão desse luto, seja pelo isolamento, pela dificuldade em acionar pedidos de ajuda, ou mesmo a rede de suporte próxima. No luto, o que se vai ouvindo dos outros, pode ser sentido como invalidante, constituindo um fator de risco para a saúde psicológica e ainda a adaptação a um processo tão difícil, como é a elaboração do luto gestacional.

Em alguns casos, o luto gestacional está associado a sentimentos de vergonha e culpa e à presença de sintomatologia, como a depressão e a ansiedade.

Como Lidar com o Luto Gestacional

Cada pessoa vive o luto de uma forma única e, ao mesmo, tempo é possível deixar algumas orientações que possam ser protetoras:

Permita-se sentir: É importante dar espaço às emoções e sentimentos – tristeza, dor, raiva, culpa, confusão, negação, angústia e sofrimento. O luto é um processo de ajustamento, onde a dor e a realidade são integradas mediante uma série de tarefas que têm de ser reconhecidas e vividas. É crucial que o casal possa expressar as suas necessidades, pensamentos, emoções e, claro, sentir-se escutado validado, em vez de ser levado a “não pensar” ou “seguir em frente” apenas numa lógica de funcionalidade e evitamento.

Respeite o tempo: Cada pessoa necessita de tempo para elaborar a perda do seu bebé, sem pressas e prazos. Cada um (individualmente) e cada casal e família viverá o seu luto de uma forma muito particular. Respeite o seu ritmo e evite comparações com outras histórias. Ao mesmo tempo, é importante encontrar pontos de encontro entre o ritmo de cada um, do pai e da mãe, da mãe e da avó, do pai e do filho mais velho… Esse desafio – de ter um meio termo onde todas as necessidades sejam importantes – é gigante e podem precisar de ajuda para encontrar soluções mediadas.

Rituais de despedida: Alguns pais encontram conforto em criar rituais simbólicos, como plantar uma árvore, guardar um objeto especial ou escrever uma carta para o bebé. Estes rituais podem ajudar a dar um significado à perda e homenagear o bebé que perdeu.

Procure apoio emocional: O luto deverá ser vivido e compartilhado com pessoas próximas e, se possível, por grupos de apoio de pais que viveram uma perda gestacional. O apoio social poderá constituir um valioso suporte que ajudará a aliviar a dor e o sofrimento. Nos casos em que este apoio não é o suficiente, deverá recorrer a apoio psicológico especializado na área do luto.

Cristina Pereira, Psicóloga

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